terça-feira, 30 de junho de 2009

um leitor incansável*

* Matéria publicada na CartaCapital número 550. A biblioteca já está no ar! Acessem!

Em meio aos quase 100 mil títulos da biblioteca do empresário e colecionador José Mindlin está um trabalhador acuado. Envolvido pela maior coleção particular do País, segura cuidadosamente um livro. Lê, escaneia e vira página por página, com delicadeza e rapidez. Há quase dois meses repete incansavelmente a rotina. Por suas mãos já passaram exemplares raros, originais de Machado de Assis, José de Alencar e Joaquim Manoel de Macedo. Sermões do Padre Antônio Vieira ou gravuras de Jean-Baptiste Debret. Edições raríssimas, todas fora de catálogo ou praticamente inéditas no País, reunidas por José Mindlin desde os 13 anos de idade.

Tamanho cuidado e precisão são necessários. O trabalho delicado é o passo inicial para a realização do projeto de digitalização da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin, acervo de quase 17 mil títulos que pertencia ao bibliófilo e foi doado à Universidade de São Paulo em 2006. Esta pequena, porém suntuosa, parte de seus livros, antes restrita, ganha lugar na internet a partir da semana que vem. O trabalhador citado anteriormente, responsável pela transferência das obras para o computador, é um robô de Nova York.

Inédito na América Latina, o Kirtas APT 2.400 BookScan custa cerca de 220 mil dólares e foi uma aposta da Fundação de Amparo à Pesquisa de São Paulo (Fapesp), que doou o equipamento à universidade e trabalha em parceria com ela. Especializado em digitalização de livros encadernados, o scanner robotizado é capaz de ler 2.400 páginas por hora. Um livro de 300 páginas, por exemplo, pode ser transferido para um computador em meros oito minutos.

Uma vez digitalizado, o conteúdo do livro é acessado pela equipe de pesquisadores e operadores da USP por meio de soft-wares livres e customizados. O grupo organiza o material para disponibilização on-line em uma página com acesso irrestrito. Assim, mapas, manuscritos, gravuras e textos antigos passam a ser propriedade não só da universidade, mas de quem quiser, gratuitamente, em casa, imprimir, copiar ou consultar os arquivos. Selecionar, recortar e buscar palavras em textos, da maneira que lhe for apropriada. Sem pagamentos ou senhas, o acesso a obras de domínio público que, normalmente, pouco são tocadas nas prateleiras das bibliotecas tradicionais, torna-se universal.

O projeto é grandioso e pretende atingir não só a Brasiliana de Mindlin, mas outras bibliotecas da universidade, como as dos cursos de Direito e Filosofia. A fase atual é de experimentação. A partir da próxima semana, estará disponibilizada uma pequena amostra, cerca de 5 mil títulos, do que poderá ser um dos maiores acervos on-line do mundo. O endereço digital (http://brasiliana.usp.br/) será lançado durante o Seminário Mindlin 2009, que acontece entre os dias 16 e 18 de junho no Museu de Arte de São Paulo. Entre os convidados estará Beatriz Haspo, responsável pela divisão de coleções, acesso e empréstimo da exemplar e monumental Biblioteca do Congresso americano. Jean- Claude Guedón, professor da Universidade de Montreal, no Canadá, vem para falar sobre as políticas de digitalização, assunto no qual é considerado uma autoridade.

Coordenada pelos historiadores e professores da USP István Jancsó e Pedro Puntoni, a Brasiliana Digital tem a ambição de se equiparar aos grandes acervos mundiais. “Esta revolução tecnológica, a digitalização robotizada, tem permitido um ganho de velocidade de processamento. A técnica está por trás dos grandes projetos internacionais, como o Google Books”, diz o professor Puntoni, citando o bem-sucedido modelo de acervo on-line gratuito pertencente ao maior site de buscas do mundo.

“A ideia do projeto é tornar a vida do usuá-rio mais fácil. Esta versão é um teste, mas queremos receber os comentários e aperfeiçoá-la, deixá-la mais estável. A inclusão digital não pode servir só para navegar no Orkut”, afirma Puntoni, diretor da Biblioteca Brasiliana Guita e José Mindlin. A fase piloto, que se estende até 2010, pretende disponibilizar cerca de 10 mil títulos.

A importância do empreendimento vai além da pesquisa. O conteúdo deve ser entendido como instrumento para fortalecer a educação nacional, já que pode auxiliar na produção de material didático para todos os níveis escolares. Serve ao nível fundamental da mesma maneira que pode auxiliar as análises avançadas na área de humanidades. “É um acervo em crescimento, estendido a todos os que tiverem interesse e conexão”, diz o professor Jancsó.

A consulta irrestrita via web a material bibliográfico tão vasto ajuda, sobretudo, a manter duas funções fundamentais de um acervo, o acesso da população ao conteúdo e a preservação histórica. Ironicamente, essas funções tendem a se chocar. Como permitir o manuseio de conteú-do tão raro e ao mesmo tempo conservá-lo em perfeitas condições? Muitas vezes, por se preocuparem mais com a segunda função, bibliotecas restringem o acesso a preciosidades. Um toque descuidado, um pedaço amassado ou um risco sobre o papel podem destruir peças de valor cultural e financeiro altíssimo.

Assim como obras de arte, muitos livros conservados ao longo dos anos se transformam em objetos para ser vistos, não tocados. A tecnologia, que reproduz o livro em fac-símile virtual, anulará esse impedimento. “Em termos de solução técnica, é o que há de mais moderno. Queremos chegar em 2012 com 100 mil objetos digitais de toda a universidade”, almeja o professor Jancsó.

A casa de Mindlin é, contudo, uma estada temporária para o equipamento. Já está em fase de construção, dentro do campus da USP, o prédio que abrigará a coleção, também de acesso irrestrito. O projeto, assinado pelo neto de Mindlin, Rodrigo Loeb, foi pensado para abrigar os 17 mil títulos em três grandes andares cir-culares. Destaque de protagonista à coleção. Laboratórios e centros de pesquisa voltados à área de preservação também devem ser instalados ali. Formarão a nova moradia do trabalhador robô, que deixará a biblioteca pessoal de Mindlin.

O bibliófilo de 94 anos maravilhou-se com a tecnologia no centro de sua sala. “Realmente, não tinha pensado que chegaria a esse ponto”, diz. “O que está sendo feito aqui é só o começo de um processo bastante longo e interessante. Mas duvido que, na idade em que estou, possa ver o projeto concluído.”

Se plenamente concretizada, a Brasiliana Digital poderá ser modelo de uma futura estrutura nacional, que interligue instituições públicas e privadas. Além de dar ao Brasil posição de destaque no meio, resgatará aos brasileiros parte da história da literatura que pode não estar esquecida, mas, por certo, muito longe da acessibilidade.
terça-feira, 23 de junho de 2009

sumiço!

É, gente, eu sei... Eu sumi!!
Mas tô voltando, aos poucos, cheias de matérias e novidades!

A mais legal é que agora vcs podem me encontrar também no Impulso HQ! Uma vez por semana estarei por lá escrevendo a coluna HQ que acontece, sobre quadrinhos e artes visuais em geral.

A da semana passada ainda está no ar! Se ainda não conhecem, passem lá!

Por enquanto, é só. Mas em breve, volto com mais!

bjos!!
domingo, 14 de junho de 2009

21ª e-blogue no ar!


Gentem,

A parceria com o E-blogue continua e a 21ª edição do fanzine semanal está no ar!

Essa edição está cheia de posts voltados para as artes visuais. Tem quadinhos, grafite, intervenções urbanas e mais um monte.

Passem lá!
terça-feira, 9 de junho de 2009

setlist.fm


Quer saber o que o Nine Inch Nails tocou semana passada num show em Mainsfield? Ou o que o Oasis tocou antes de ontem em Manchester? Ou o que o Slipknot mandou no Rock Am Ring que rolou no fim de semana na Alemanha? É obvio que eu não fui em nenhum desses showzaços, mas eu sei que eles foram muito bons graças ao Setlist.fm!

Imagina uma wikipedia de setlists. É isso! Você vai lá, digita o nome de uma banda e tcharã! Todos os setlists de todos os shows que vc imaginar. São ao todo 29,816 de 2,726 artistas diferentes. E tem de tudo, eu testei. MGMT na Austrália? Vampire Weekend em Minneapolis? CSS na França? Britney Spears no Texas? Tá tudo lá!!

O site é colaborativo, então, a cada dia, novos usuários atualizam as listas. Diversão garantida, muitos minutos gastos em pesquisa e uma dorzinha no coração por perder tantas apresentações boas são alguns dos efeitos causados pelo site!
segunda-feira, 8 de junho de 2009

tirinhas são o melhor remédio!

Quando eu estava na faculdade todo mundo me zoava porque eu (literalmente) chorava de rir com as tirinhas dos jornais. Mas, gente, é impossível não chorar! Adão é um gênio!



publicada hoje no site dele.
quinta-feira, 4 de junho de 2009

yves saint-laurent no rio


De bom gosto incomum e apreciador de todas as manifestações artísticas, o francês Yves Saint-Laurent foi, durante toda sua trajetória, um homem a frente do seu tempo. Voltou-se cedo ao mundo da moda e antes de completar vinte anos já trabalhava com um dos mestres do ofício, o também francês Christian Dior. Foi com ele que aprendeu a valorizar e a entender a figura feminina, que desde então se tornou sua fonte contínua de inspiração.

O Ano da França no Brasil traz ao país uma seleção inédita de figurinos criados pela maison YSL na mostra Viagens Extraordinárias, em cartaz no CCBB do Rio de Janeiro. São peças que contam não só a trajetória do estilista, mas também ajudam a recontar a história da moda e explicitam porque Saint-Laurent é, até hoje, considerado um mito.



Morto em junho do ano passado, aos 72 anos, o francês buscou, a cada nova coleção, trazer para o vestuário feminino moldes inspirados em universos múltiplos. Seja focado em etnias africanas ou simplesmente masculinizando a vestimenta feminina, Saint-Laurent não só criou um estilo, mas ajudou a adaptar uma nova postura à mulher. Junto com Coco Chanel, também francesa, deu voz à liberdade feminista quando criou sua peça símbolo, o smoking, em 1966. Traje comum para os homens ou para os dias atuais, à época foi desfilado por mulheres como peça transgressora, que aliava masculinidade à sempre feminina transparência.


Desta forma, sem abandonar a alta costura, Saint-Laurent criava e dava espaço ao chamado Prêt-à-porter, ou ready-to-wear, a moda casual que hoje sustenta tanto as casas tradicionais quanto os novos estilistas. Na exposição do CCBB, o visitante será capaz de revisitar diversas fases de Saint-Laurent. Os cerca de 50 figurinos expostos são inspirados em viagens continentais que o francês fazia mentalmente, já que pouco gostava de sair da França. Pesquisas profundas o inspiravam a criar coleções inteiras focadas em diferentes países como África, Ásia, Espanha, Índia, Marrocos e Rússia.



Além das roupas, a mostra reúne croquis, acessórios e réplicas ampliadas dos cartões Love, tradicional mimo que a maison distribuía a clientes e amigos durante o Natal, uma prática que durou mais de 40 anos. Todo o material exposto pertence à Fundação Pierre Bergé -Yves Saint-Laurent, criada em 2004 para preservar o acervo da marca. Em fevereiro deste ano Pierre Bergé, companheiro de vida e trabalho, leiloou a coleção de arte que divida com Saint-Laurent. Esculturas de Brancusi, pinturas de Matisse e outros itens valiosos bateram recorde de leilões do tipo, atingindo a marca de 370 milhões de euros.
segunda-feira, 1 de junho de 2009

sábado dos meus amores, de quintanilha

A paixão de um senhor de periferia pelo time do coração, os bastidores de um jogo de cartas num circo de interior ou o azar de um operário no bolão de loteria da fábrica. São temas como estes que permeiam as narrativas, bem brasileiras, que formam Sábado dos meus Amores (ed. Conrad, 64 págs, R$39), do quadrinista Marcello Quintanilha.

A HQ traz seis pequenas histórias e já na primeira delas o autor parece anunciar certo tom de crônica presente em toda a obra. Para isso, usa como personagem um distraído Rubem Braga, que segue uma borboleta amarela, enquanto cruza uma avenida, no Rio de Janeiro de 1952. Quintanilha, fã do escritor capixaba, também aproveita, em outros momentos, humor e lirismo quando narra a paixão do brasileiro por futebol ou o amor de uma moça por um jangadeiro nordestino. Esta última, um saboroso enredo, sutil e ingênuo.

Quadros escuros e com cores fortes são trabalhados em grafite e aquarela, técnicas distintas que utilizadas em conjunto fazem um bonito jogo de sombras, dando às imagens, e principalmente aos personagens, brilho especial. Na tentativa de explorar ainda mais os inúmeros tipos que protagonizam as páginas, Quintanilha deu aos balões de diálogo diferentes formatos. Normalmente rígidos, recebem atenção especial como se espelhassem o sotaque distinto de cada região.