domingo, 1 de julho de 2012

miranda taxi foto*


*originalmente publicada na CartaCapital, em 2010. 

POR CAMILA ALAM 

Foi no bairro paulistano da Vila Madalena que Antonio Miranda nasceu, viveu e se dedicou ao trabalho de taxista, ofício que sustenta sua mulher e seus dois filhos.  Graças ao bairro, também, deu chance a um desejo antigo, o de tornar-se fotógrafo. Hoje, aos 49 anos, firma ponto na esquina das ruas Wisard e Fradique Coutinho, esta ultima testemunha de sua infância no bairro, numa época em que estava longe de ser uma das predileções da boemia paulistana.

Recheado de artistas e estúdios fotográficos, o bairro trouxe ao banco de trás de Miranda alguns experientes profissionais que o ajudaram nas primeiras tentativas, por volta de 2006. Curioso e atento a fotografia desde adolescência, Miranda questionava, pedia dicas e era atendido. Ganhava livros e elogios, mas com as críticas aprimorou o olhar. Fez do seu sustento, sua escola, seu estúdio e sua divulgação. 

É um fotografo a moda antiga. Seu equipamento predileto é uma yashica x, modelo encontrado depois de percorrer feiras de antiguidade como as da praça Benedito Calixto e a do bairro do bexiga.  “Tava lá jogada”. Protegida em uma bolsa térmica, a pequena máquina e seus rolos de filme acompanham o taxista pela cidade, bem escondidas embaixo do banco do motorista. 

Prédios antigos, árvores retorcidas, reflexos da cidade. Os objetos de atração do taxista passam diariamente por sua janela e são devidamente observados. Se, durante uma corrida, passa por ambiente que chama sua atenção, Miranda segue ao destino,  deixa o passageiro e volta para fotografar o que quer que seja. São nas viagens mais longas que cliques descompromissados acontecem fora do taxi. Seu primeiro ensaio, surgiu depois de deixar uma passageira no convento da boa vista. “Me chamava atenção as arvores com troncos exóticos, retorcidos, ensaios de sombra e luz e gramados. Eu ficava lá fotografando, até as freiras me colocarem pra fora”. 

Agora também olha para a cidade, buscando arquitetura antiga, escadas inusitadas. Olha para os cemitérios, onde se inspira na arte tumular. No centro velho, começou o projeto que chama “cidade dentro da Cidade”, onde dedica a série aos prédios antigos e aos moradores de rua que dormem aos seus pés. Iniciado o projeto, ainda não conseguiu terminar. “Me abalou demais. Quem tem olhar e consegue ver esses problemas, sabe que vivemos numa cidade de mentira. O sistema assistencial é mentira, a prefeitura é uma farsa”. 
Em uma das poucas inserções ao retrato, Miranda conheceu o morador de rua Giovani. Sem máquina a mão, registrou o rosto do mendigo com o celular, que possui uma câmera simples de 3 megapixels, cuja ampliação chega até 30x45. “Acho que colocaram a lente errada aqui”. Desde então, sai as ruas registrando tudo no celular, imagens que depois posta no blog (HTTP://mirandataxifoto.blogspot.com) que criou com a ajuda de fotógrafos amigos da vila madalena.  “De computador não entendo nada. Montaram o blog e me ensinaram a atualizar”. Miranda também não usa Photoshop ou qualquer outro programa de tratamento de imagens. “Minha essência é a simplicidade, não tenho recursos para fazer foto”. 
Pelo celular, entrou na era da digitalização. Aprendeu  que pode gastar menos e treinar mais. Com o filme, passou a ser mais seletivo e buscar resultados. Hoje, diferencia as duas maneiras de fotografar. “Existe a foto e a fotografia. A fotografia parece coisa boba, mas ela tem algo mais que uma simples foto.”

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