domingo, 10 de julho de 2011

Audrey Tautou

Em junho, entrevistei a atriz francesa Audrey Tautou para a revista RG. Foi tudo muuuito rápido, tínhamos apenas 10 minutos para conversar. Ela foi simpática, mas parecia um pouco cansada. Abaixo, o texto publicado.


Audrey Tautou fez uma passagem relâmpago pelo Brasil para divulgar seu novo filme Uma Doce Mentira. Na comédia romântica, sua personagem recebe uma carta de amor anônima e, sem dar a menor bola, a entrega para a mãe meio deprê. E começa a confusão. Simpática, a atriz recebeu RG para uma rápida conversa em um hotel em São Paulo e disse não ligar nem um pouco pra moda. Mas a gente bem reparou no casaquinho Chanel que ela usava.

Como está sendo essa primeira passagem pelo Brasil?

Estou super feliz. Ainda não tive tempo de conhecer muito a cidade, sinto muito calor humano e simpatia. Pude visitar o Museu de Arte de São Paulo, achei a coleção extraordinária e a arquitetura muito interessante. Adoro frequentar lugares que ainda não conheço.

Em Uma Doce Mentira sua personagem é bastante confusa, não?

Sim, ela é incrível. Está cheia de boas intenções, mas não pensa nas consequências de seus atos. Ela tem muita confiança em si mesma, mas pode desmontar com facilidade e às vezes até agir com má fé. Eu adoro personagens assim, cheio de nuances.

Você se sente atraída por Hollywood?

Não tenho um desejo de ter uma carreira hollyoodiana. É um sistema muito louco e diferente do que eu busco. Eu não procuro grande exposição e nem quero ser uma huge star. Viajar para divulgar filmes franceses é muito mais prazeroso.

Encarnar Coco Chanel e virar garota propaganda da marca mudou sua relação com a moda?

Na verdade, esta é uma relação pouco estreita. Não tenho muita afinidade com a indústria, como pensam. Admiro alguns designers, mas me preocupo pouco e nem leio revistas especializadas.

sábado, 4 de junho de 2011

entrevista fernanda feitosa

Esta mini entrevista foi publicada originalmente no site da RG em maio, época da SP Arte.


Fernanda Feitosa, diretora e idealizadora da SP-Arte, conversou com RG sobre as novidades da feira, que acontece entre os dias 12 e 15 de maio, no Pavilhão da Bienal, em São Paulo

RG: Depois de sete edições, a SP-Arte está mais madura?

Sim, a cada ano batemos novos recordes e hoje podemos ver o impacto que a feira produz no Brasil. Ano passado, por exemplo, tivemos mais de 16 mil visitantes dos mais diversos tipos. São famílias, estudantes, empresários, gente que trabalha, vive ou aprecia arte. Este número se reflete nas próprias galerias, que veem aumentar o seus visitantes.

RG: Isso se reflete nos números de vendas?
A economia está estável e a maneira como o Brasil superou a crise financeira mundial dá otimismo ao comprador. Ainda é pequena a parcela de visitantes que efetivamente compram na feira – menos de 10% -, mas não é um mercado restrito ou limitado a quem tem dinheiro. Há obras para todos os bolsos. Um dos trabalhos da feira é levar às galerias público que começa a entrar neste mercado.

RG: Há uma seleção para escolher as galerias participantes?

Qualquer galeria pode se inscrever para participar. Este ano muitas ficaram na lista de espera, mas mesmo alguns artistas e galeristas que não participam da feira me escrevem para agradecer o fato dela existir. De certa forma é uma inclusão profissional.

RG: Quais novidades deste ano?

Uma direção que estamos tomando, e também um avanço, é a de apresentar obras em grandes formatos. Elas servem essencialmente a compradores institucionais, que procuram obras impactantes. Como não são de escala doméstica, ocuparão o último andar do pavilhão.

RG: Que dicas dar a quem quer investir?

Nós não costumamos ter o mesmo gosto a vida inteira. Apreciar arte é um exercício constante, um processo criativo. Eu deixei de comprar coisas há 10 anos que hoje me arrependo. Mas o essencial é investir naquela arte que dialoga, toca e transmite sentimento. A regra número um é gostar.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

sp-arte

Esta matéria foi originalmente publicada na Revista RG, que já está nas bancas.

O Fabuloso Encontro das Artes

Por Camila Alam

Imagine reunir em um só local artistas como Anita Malfatti, Damien Hirst, Alfredo Volpi, Leon Ferrari e muitos outros. Este encontro, talvez possível em imaginação, se torna real entre os dias 12 e 15 de maio, durante a sétima edição da SP-Arte, feira que une o que há de melhor no mercado da arte nacional e internacional.

Em sua sétima edição, a SP-Arte não só se mostra mais respeitada aos olhos dos comerciantes, como se revela ainda maior, atraindo apreciadores, curiosos e entendidos. O hot spot é o suntuoso Pavilhão Cicillo Matarazzo, o mesmo que recebe a Bienal. Durante os dias do evento, 85 galerias dividem espaço amigavelmente e trazem à tona mais de 2500 obras de artistas consagrados e emergentes em uma verdadeira celebração a arte e ao poderoso mercado que a sustenta.

Idealizadora e diretora da feira, Fernanda Feitosa acredita em um principal mérito da SP-Arte. Assim como um grande museu, a feira é capaz de despertar nos visitantes a paixão permanente pela arte. “É importante para o artista ter público e para gerar uma economia criativa. Mas além de tudo, participar de vida cultural de um país é um ato cidadão”, diz a empresária.

Além de passear por acervo tão amplo e entrar em contato com a obra de brasileiros ilustres de diferentes gerações, como Cândido Portinari, Leonilson ou Cildo Meirelles, o visitante tem oportunidade de mergulhar no universo de grandes nomes da arte contemporânea ainda pouco vistos no país. É o caso do grego Jannis Kounellis ou da fotógrafa americana Francesca Woodman, ambos com espaços garantidos na agenda da Tate Modern londrina. Ou ainda de Bunny Yeager, queridinha pin up dos anos 1950 e amiga de Betty Page, que naquela época abandonou as poses em frente às câmeras e se tornou “a fotografa mais linda do mundo”. O escultor norte americano Richard Serra, único a possuir uma exposição permamente no Guggenheim de Bilbao, também entra no hall dos imperdíveis, assim como Damien Hirst e Marina Abramovic

“Gostar de arte é um exercício constante. Ao longo da vida o gosto vai mudando e esse processo leva a vida inteira”, diz Feitosa, que ultimamente tem se encantado com a vídeo arte dos brasileiros Eder Santos ou Leonora de Barros. Deste principio pessoal, parte o maior conselho da empresária para quem já investe ou quer investir neste mercado. “Além do valor comercial, é necessário manter um diálogo com a obra que se quer comprar. A regra número um é perceber o sentimento transmitido pela obra e a emoção que ela lhe proporcionará. Para esperar retorno financeiro, é melhor investir na bolsa de valores”, brinca.

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

inverno da alma

INVERNO DA ALMA

Debra Ganik

É numa paisagem fria e pouco habitada que se passa o longa Inverno da Alma, indicado ao Oscar de melhor filme. Mas não é no pasto gelado de uma cidade no interior dos Estados Unidos que este filme se apóia, mas sim, nas frias relações que rondam a garota Ree (Jennifer Lawrence). Aos 17 anos, cuida dos irmãos menores e da mãe doente.

Seu único bem, a casa onde moram, está prestes a ser confiscada caso o pai foragido da polícia não apareça na reunião da liberdade condicional. Para não perder seu único porto seguro, ela busca o pai incansável e corajosamente entre figuras que despertam raiva e indignação, alguns seus próprios parentes. Entre brigas de gangues, tráfico e produção de drogas, esta trama se desenvolve de maneira dura, tanto à protagonista, quanto ao espectador.

A personagem impressiona por sua força ao buscar a sobrevivência, dela própria e daqueles que dela dependem. Em meio ao sofrimento e desespero da jovem em um cenário pouco comum em Hollywood, a atuação de Lawrence é exata e firme, sua expressão inalterada. A atriz de 20 anos, praticamente iniciante, concorre ao Oscar em sua categoria. John Hawkes, no papel do imprevisível tio Teardrop, está na briga pela estatueta de Melhor Ator Coadjuvante.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Achados de família

Thomaz Farkas revira seu acervo e redescobre sua própria trajetória

POR CAMILA ALAM

Quinze enormes álbuns de fotografias, mais de 450 rolos de filme de 35mm, dezenas de caixas com ampliações-guia e outros 100 rolos de negativos 6 x 6. Este vasto acervo fotográfico, pertencente ao húngaro naturalizado brasileiro Thomaz Farkas, foi revirado e redescoberto no último ano por seus filhos, João e Kiko Farkas. O material, em parte inédito, traz imagens feitas na juventude, nas perambulações de Farkas pelo país ou em andanças pela cidade de São Paulo. Esta pesquisa se mostrou repleta de surpresas e dela surgiu a retrospectiva Thomaz Farkas: Uma Antologia Pessoal, exposta na sede paulista do Instituto Moreira Salles, a partir de 27 de janeiro e também reunida em livro.

Nascido em Budapeste, em 1924, veio ao Brasil com a família no começo da década de 1930. Herdeiro de uma das grandes empresas de equipamentos fotográficos, a Fotoptica, ganhou cedo do pai sua primeira câmera. Na adolescência e no início da vida adulta, participou do Foto Cine Clube Bandeirante, cujas reuniões aconteciam no mesmo prédio da empresa familiar. Ao lado de outros frequentadores, como Geraldo de Barros e German Lorca, participou de salões e premiações. Foi visto como mascote da turma e ao mesmo tempo prodígio.

Durante um ano debruçados sobre o acervo do pai, os filhos João e Kiko selecionaram, ao lado dos técnicos e curadores do IMS, imagens que resumem sua produção fotográfica nas décadas de 1940 à 1970. Ao fotógrafo, hoje com a saúde um pouco debilitada, coube a inspeção, os mergulhos na memória, as redescobertas em torno de sua própria e trajetória. “Não me lembrava desta...”, dizia a toda hora, segundo João, seu terceiro filho.

De cunho geométrico e experimental, suas imagens iniciais vieram a antecipar o construtivismo, movimento crescente nas artes visuais durante a década de 1950. “Muito cedo ele pode fotografar com suporte. Desenvolveu uma linguagem própria ainda na adolescência, uma documentação muito leve, jovem, instigante”, diz Sérgio Burgi, coordenador de fotografia do IMS e um dos pesquisadores do acervo de Farkas. Desta época, surgem cenas noturnas da capital paulista. Muitas inéditas, como Ensaio do Balé Russo no Teatro Municipal ou Escadaria da Galeria Prestes Maia, ambas de 1946, onde é explícita sua procura pelo chiaroscuro, pelas construções de luz em torno da paisagem e de personagens.

Mais tarde voltado a uma visão humanista, Farkas se dedicou à imagens documentais, personagens e cenas cotidianas registradas em viagens que fez pelo país. Em Brasília, na década de 1950, não se limitou à registrar a construção da cidade, mas pesquisava os arredores, visitava povoados dos trabalhadores que erguiam a capital, os candangos. Por muito tempo, viu a fotografia como um passatempo pessoal, principalmente depois de começar a trabalhar na produção de documentários, na década de 1960. “Ele faz uma opção pelo cinema, chegou a anunciar que pararia de fotografar”, diz Burgi.

Com o projeto Carvana Farkas realizou filmes no interior do Brasil, voltados para a redescoberta de nossas raízes, dirigidos por ele mesmo ou colegas como Eduardo Escorel e Maurice Capovilla. Uma série de documentários, intitulada A Condição Brasileira, registrava a vida nas periferias das grandes cidades do Norte e do Nordeste, em material de caráter pedagógico. Naqueles tempos, foi acusado de colaborar com a guerrilha, o que lhe rendeu uma semana de cárcere no DOI-CODI, em 1968. Tinha, no entanto, uma visão menos idealista, mais preocupada com linguagem e a educação.

Desde criança, o filho João lembra do pai com a câmera pendurada no pescoço, sobretudo nas reuniões de família. Ao revirar o acervo, a descoberta foi também pessoal. Entre as centenas de imagens cuidadosamente arquivadas por Farkas, estão cenas tradicionais da família, imagens que João e Kiko pouco lembravam, outras totalmente desconhecidas. São cenas familiares, algumas tiradas antes do nascimento dos filhos, que ganham ares raros, ao mesmo tempo em que desembocam numa viagem afetuosa nunca antes vivenciada pelos irmãos.

“Examinar pela primeira vez todos aqueles negativos ofereceu a mim e ao Kiko uma experiência de reconstrução afetiva e de descobertas estéticas. Nossa excitação e deslumbramento foi crescente à medida que descobríamos personagens sem registro em nossas memórias”, diz o filho. Como editor de fotografia, João passou anos examinando produções de fotógrafos diversos. Ao se debruçar sobre a obra do pai, pode perceber pela primeira vez o natural desenvolvimento de um artista, cuja obra inicialmente marcada pela técnica ganhou contornos pessoais e simbólicos.

Destas pastas pessoais, o IMS e a família Farkas pretende dar conta de outro projeto, o de mostrar o fotógrafo e sua intimidade, os familiares, cenas íntimas de uma tradicional família européia na capital. Toda seleção também será feita sob olhar atento do artista, que hoje apenas brinca com os efeitos de uma câmera digital. Em sua trajetória, registrou os seus e o povo. Mais do que lidar com manifestos artísticos ou políticos, se importou com questões de linguagem e caminhou pelos sentimentos e diálogos. Com sua conhecida alegria de viver, costuma ainda cumprimentar aqueles que o abordam com um “Viva! Viva a fotografia!”.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

3º circuito moda e arte

3º CIRCUITO MODA E ARTE

Centro Cultural Banco do Brasil

Até 30 de janeiro

Em comemoração ao aniversário de São Paulo, o Centro Cultural Banco do Brasil realiza o 3º Circuito de Moda e Arte, que aborda a relação da cidade com a moda. A programação é focada em debates e mesas redondas para discutir a indústria na capital e no Brasil, além da exibição de filmes que de alguma maneira influenciaram comportamentos e criações.

Entre os longas escolhidos, estão clássicos raros como Aldeia da Roupa Branca (1939), de Chianda de Garcia e o Anjo Azul (1930), de Josef Von Sterberg. Foram também selecionados Juventude Transviada(1955), de Nicolas Ray, Feios, Sujos e Malvados (1976), de Ettore Scola, além de documentários como Histórias de Elle e A elegante Polly Magoo.

A cada dia, convidados se reúnem para debater sobre as conexões entre moda e cinema ou sobre as diretrizes traçadas por novos estilistas. No dia 25, aniversário da capital paulista, o produtor Fernando Zelman e o professor João Braga fazem análise sobre a relação da moda com a cidade, desde a colonização até os dias atuais, por meio de estudos econômicos políticos e sociais. Programação em www.galeriacentral.org.

aquele que não sabia desenhar

95 gravuras originais trazem ao Brasil o universo de M.C. Escher

POR CAMILA ALAM


“Não é mesmo um absurdo, traçar algumas linhas e depois dizer que é uma casa?”. Absurda é a idéia de que o autor desta frase, artista gráfico holandês Maurits Cornelis Escher (1898-1972) se considerasse um desenhista ruim, daqueles que pouco improvisam e dependem de modelos reais à mão. Em meio às suas paisagens, ladrilhos, reflexos, repetições e estudos de perspectiva infinita, vez ou outra recorria a estes modelos, alguns de sua própria autoria. Mas são de sua imaginação e curiosidade que saíram suas mais brilhantes composições, xilogravuras e litogravuras que sugerem enigmas e estão expostas a partir de 18 de janeiro no Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio de Janeiro, e a partir de abril em São Paulo.

Sucesso de público em Brasília, com mais de 190 mil visitantes, a exposição O mundo mágico de Escher apresenta 95 gravuras originais, desenhos e instalações, vindos do Museu Escher, na Holanda, aqui sob curadoria de Pieter Tjabbes. Foram cinco anos de negociação para trazer ao país as frágeis obras do artista. Dentre elas, estão paisagens pouco conhecidas, feitas na juventude, como a série Flor de Pascua (1921). São ilustrações de um folheto escrito por um amigo da Escola de Arquitetura e Artes Decorativas de Haarlem, sua primeira encomenda. Nesta embrionária série de xilogravuras pouco detalhadas e mais rústicas estão temas que M. C. Escher trataria por toda vida em sua obra. Nesta seqüência de pequenas dimensões (12cm x 9cm) aparecem a natureza, fundamental em sua obra, em meio a ladrilhos, repetições e espelhamentos. Montanhas, salamandras, plantas, sapos e formigas se fazem presente desde este início.

A exposição segue cronologicamente até sua estadia na Itália, onde permaneceu até 1935 e desenvolveu trabalhos sobre a perspectiva e a ilusão de ótica. O universo é tema freqüente, influência pelo período em que costumava observar o céu com seu pai, de quem havia ganhado um telescópio na adolescência. Alguns teóricos, como a historiadora Micky Piller – que assina textos no catálogo da exposição -, acreditam que a obra de M. C. Escher se divide neste momento. A partir de então, o holandês passou a explorar as metamorfoses, os caminhos cíclicos, os mergulhos no infinito, em gravuras que o consagraram e ao mesmo tempo foram rejeitadas pelos críticos de arte da época, que custaram a vê-lo como um artista moderno. Sua primeira mostra retrospectiva aconteceu somente em 1968, quatro anos antes de sua morte.

Seus verdadeiros admiradores, a princípio, eram os cientistas, encantados pela lógica matemática e geométrica de seus trabalhos, como Dia e Noite, de 1938. Com alguns deles costumava bater papos curiosos, buscando inspiração. “Durante um longo período era mais fácil encontrar uma gravura de Escher num departamento de matemática do que em um museu”, diz Piller.

Um dos prazeres do artista era confundir o espectador, criar linhas e padrões ilusórios. Gostava de misturar dimensões, ignorar a gravidade. Não raro, suas correntezas subiam rio acima, ou suas escadas perdiam o fim nas alturas. Suas paisagens conduzem o olhar do espectador para um movimento cíclico que nem sempre faz sentido. “É preciso haver certo grau de mistério, mas que não seja imediatamente aparente”, disse em 1963. Assim como o pintor italiano Giorgio de Chirico (1888 – 1978), seu contemporâneo, brincava com a perspectiva de maneiras diversas. Para Piller, o espectador precisa “caçar” o ponto de vista, que pode mudar várias vezes em uma mesma imagem. “Quem aceita essa lógica escheriana se sente em casa no mundo dele, onde a eternidade e a infinitude se abraçam”.

A infinitude se faz presente também quando o artista se utiliza de espelhos para criar espaços impossíveis, como Natureza-morta com espelho (1934) ou Natureza-morta e rua (1937). Em ambas, é preciso atenção do espectador para perceber diferentes planos e espaços que, embora impraticáveis, pareçam reais. “Sua realidade tem aparência totalmente plausível”, aponta a historiadora. Em outras ocasiões, seu reflexo em espelhos convexos dá origem a autorretratos, explora o ambiente por trás do artista, revela ao espectador o entorno de seu atelier, o espaço que há entre o observado e o observador.

Sob influência da matemática e dos azulejos mouros desenvolveu ladrilhos, feitos com variações de um mesmo tema ou metamorfoses. O artista via nas repetições uma maneira de demonstrar seu fascínio pelo infinito e pela eternidade. Eram, segundo o próprio, seu tema mais importante e realizou alguns em parceira com a esposa, Jetta. Ainda em 1922 fez deste um tema presente, como em Oito cabeças, em que um padrão de bustos se encaixa e é repetido diversas vezes.

Não à toa, a exposição O mundo mágico de Escher, em cartaz no Rio até março, explora as instalações interativas e tecnológicas, que fazem o visitante mergulhar neste amplo universo. São ao todo dez instalações, onde o espectador vivencia o infinito, a repetição e as ilusões de ótica criadas por especialistas em espelhos. Uma das preferidas do público é a sala que inaugura a mostra, conhecida também como Sala de Ames, criada pelo cientista americano Adelbert Ames Jr. Em um pequeno cômodo, com o chão quadriculado, dois visitantes se colocam em cantos opostos. Por meio de ilusão de ótica, um deles parece um gigante e o outro, um anão. Em outras, há o efeito de buraco infinito ou de metamorfose. Em A Casa de Escher, o visitante é convidado a adentrar a gravura Autorretrato em esfera espelhada (1935).

Além das instalações, o visitante poderá assitir a filmes que passeiam por quatro obras do artista. “Muito mais que uma exposição tradicional, tentamos fazer uma vivência da obra do artista. Sem perder qualidade, queremos também atrair aquele público que não costuma freqüentar espaços culturais”, diz Tjabbes.

Deste universo, surgem hoje citações e homenagens, além de inúmeras reproduções. Em 2009, o estilista britânico Alexander McQueen apresentou estamparia inspirada em suas gravuras, com tons de cinza e linhas repetitivas e delicadas. Chistopher Nolan, diretor do longa A Origem (2010), se inspirou na gravura Relatividade (1953) para criar o universo de sonhos sobrepostos, onde as escadas infinitas não levam a lugar nenhum. Se demorou a ser reconhecido no século XX, Escher adquire nestes nossos tempos ares de precursor. “Eu não consigo deixar de brincar com as nossas certezas estabelecidas”, dizia o artista.
sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

gulliver

AS VIAGENS DE GULLIVER
Rob Letterman

Repleto de críticas sociais e aberto a inúmeras leituras, o clássico da literatura inglesa As Viagens de Gulliver, de Jonathan Swift, ganha versão cinematográfica mais livre e, por vezes, simplória. No papel do aventureiro, o ator Jack Black dá ao personagem a sua própria interpretação, ou seja, aquela já carimbada em outras comédias familiares, repleta de caretas e dancinhas ao som de rock. Lemuel Gulliver é um homem inseguro e pouco corajoso. Mas ao conseguir uma viagem para explorar o Triangulo das Bermudas, vai parar em Liliput, onde se torna o gigante guerreiro, protetor do reino e amado por todos.

Para convencer os liluputianos de sua grandeza, Gulliver conta que vem de uma ilha chamada Manhattan, que morreu no naufrágio do navio Titanic ao lado de sua amada Rose, mas voltou à vida como um Avatar do planeta Pandora. Não sem antes ter se aventurado com o companheiro Jack Bauer por mais de 24 Horas. Para irritar conservadores ou iniciar os mais novos por essas aventuras, Black aproveita as referências atuais para aplicar suas piadas, que acabam dando graça ao filme. À versão original de Swift restam citações que passeiam por todo filme, como as cenas em que o herói é achado à beira da praia depois do naufrágio ou quando urina em cima do castelo para apagar um pequeno incêndio.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

troyart

TROYART
Museu Brasileiro da Escultura, São Paulo
Até 30 de janeiro

Em 2010, o Museu Brasileiro da Escultura investiu em mostras de grafite e toy arte, que se distanciam do perfil do museu, ao mesmo tempo em que atraem novos públicos. Ainda neste segmento, inaugura neste começo de ano Troyart, exposição colaborativa feita com apoio de artistas em geral, convocados por meio de redes sociais. Uma chamada aberta no Facebook e blog da instituição atraiu inscrições de diferentes partes do mundo.

Cada artista e interessado inscrito recebeu um kit enviado pelo Museu contendo três modelos de toys diferentes, com base em papel cartão e criados pelos designers Roberto Stelzer e Nelson Schiesari. Em formato de robô, os bonecos foram customizados e reenviados ao MuBE, por onde passaram pela seleção da curadora Angela Ferrada. O que se vê nesta exposição são versões para o robô em acrílico, ferro ou plástico, grafitados ou enfeitados, vindos de diferentes partes do Brasil e de países como Estados Unidos, Itália, Alemanha, Holanda, França e México.

As apropriações diversas fazem com que os bonecos ganhem identidade e personalidade própria, conceito que vai de encontro à idéia de exclusividade que mede a valorização do toy no mercado.
quarta-feira, 19 de janeiro de 2011

além da vida

ALÉM DA VIDA
Clint Eastwood

Além da Vida está longe de ser uma das clássicas produções de seu diretor, Clint Eastwood. O americano mantém a direção limpa e concisa, ao mesmo tempo em que mergulha em tema delicado e espiritual, o que faz com que este longa seja visto com surpresa e pareça menos autoral. O espectador acompanha três personagens que lidam com a morte. Um médium americano (Matt Damon) que acredita ser amaldiçoado pelo seu dom, um jovem garoto inglês (Frankie McLaren) que perde o irmão gêmeo, ao mesmo tempo em que lida com a forte dependência química da mãe e uma jornalista francesa (Cécile De France) que vive uma experiência de quase morte durante um tsunami – em uma sequência de grande impacto, que inicia o longa.

Sem se atrelar a religiões ou estabelecer dogmas, o tema da vida após a morte é tratado de forma curiosa, como uma dúvida que paira sobre os personagens. Como outros já apresentados pelo diretor, eles lidam com suas experiências de maneira solitária e corajosa. No entanto, também destoam do estilo Eastwood quando são colocados em cenas que apelam demasiado pelo emocional ou trazem fundos musicais exagerados. Entre erros e acertos, Além da Vida teve recepção fria no exterior por público e crítica. Talvez tenha trajetória diferente no Brasil, se considerarmos sucessos de bilheteria do cinema nacional como Chico Xavier, Nosso Lar.
quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

a árvore

A ÁRVORE
Julie Bertucelli

Selecionado para encerrar o último Festival de Cannes, o longa metragem A Àrvore poderia levar o espectador a uma viagem pelo místico. Depois da morte do pai, a menina Simone diz perceber sua a presença em uma enorme árvore centenária que compõe o terreno da família. A paisagem do interior da Austrália vira o cenário para longas conversas e noites dormidas aos pés das grandiosas raízes. Dwan (Charlotte Gainsbourg), a viúva e seus outros três filhos, também parecem convencidos de que há alguma força presente ali.

De alguma maneira, esta força da natureza se manifesta a partir dos acontecimentos que giram em torno desta família. Como se tivesse vontade própria, estica suas raízes ou destrincha seus ganhos sobre a casa, especialmente quando a família começa a se recompor do luto. Apesar da idéia girar em torno do sobrenatural, a diretora francesa Julie Bertucelli (de Desde que Otar Partiu) faz com que a situação seja vista mais como um elo entre os familiares, com o qual lidam cada um a sua maneira. Por fim, ele terá de ser cortado em prol da continuidade da vida. A lida com a perda e a construção da fé são exploradas com graça por meio da personagem da pequena garota, bem interpretada pela iniciante Morgana Davies. É de sua boca que saem as grandes lições.
sábado, 8 de janeiro de 2011

charles mogadom e conde euphrates

AS AVENTURAS DE SIR CHARLES MOGADOM E DO CONDE EUPHRATES DE AÇAFRÃO
Artur Matuck, Carlos Matuck e Rubens Matuck
Ed. Terceiro Nome, 160 págs, R$ 99

Pela cidade fictícia de Damar, passeia Nicolaus Copernicus, uma grande embarcação com asas de borboleta, sempre guiada pelo Conde Euphrates em companhia de Sir Charles Mogadom. Neste universo de fantasia, criado pelos irmãos Artur Matuck, Carlos Matck e Rubens Matuck em forma de história em quadrinhos, estão figuras notórias, como Santos Dumont. Em viagem a Damar, cidade com cara de sonho, o inventor teve a derradeira inspiração ao ver suspenso no ar Copernicus, o navio que voa.

Em As Aventuras de Sir Charles Mogadom e do Conde Euphrates de Açafrão, os desenhos de Rubens Matuck são feitos a lápis de cor e transbordam tons. Dão vida a figuras fantasiosas criadas na imaginação dos três irmãos há mais de 30 anos. Aos 11 anos, Rubens Matuck criara pela primeira vez o universo de Damar, em um desenho de criança reproduzido nas primeiras páginas do exemplar. Feito também a lápis de cor, o desenho de uma casa ao topo de uma montanha de cristais era o prelúdio do que mais tarde viria a se tornar esta série, feita em conjunto com os irmãos, responsáveis pela elaboração dos textos. Divididas em capítulos, algumas histórias são baseadas apenas em imagens e deixam o leitor adentrar em um mundo desconhecido. Para iniciar a jornada, textos complementares de Oscar D’Ambrosio introduzem este universo e suas referencias. Ao final, ele entrevista os principais personagens da trama.
quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

a rede social

Maior fenômeno da internet nos últimos anos, o Facebook tem a história de sua criação contada em A Rede Social, dirigido por David Fincher (de O Clube da Luta). Como Mark Zuckerberg, criador da empresa, Jesse Eisenberg faz o espectador perceber a conhecida fama de arrogante que o CEO tem. Também dá a impressão de que o especialista em relacionamentos virtuais é apenas um garoto genial (hoje com 26 anos), de olhar vago e poucas habilidades interpessoais.

Em torno deste personagem controverso, mas ainda carismático, a trama se desenrola entre processos (Zuckerberg foi acusado de plágio) e intrigas entre amigos, sobretudo com o brasileiro Eduardo Saverin (Andrewe Garfield), co-criador da rede, abandonado por Zuckerberg. O jovem americano – o bilionário mais novo da história – apesar de não ter criado o princípio de rede social conseguiu levar este conceito a índices incríveis de aprovação, fazendo o Facebook atingir 500 milhões de usuários ao redor do mundo em 6 anos.

Para isso, contou inicialmente com o know how de Sean Parker (Justin Timberlake), aquele que há pouco mais de dez anos provocou uma revolução na indústria fonográfica ao criar o Napster, programa usado basicamente para compartilhar músicas na internet. Entre cenas engraçadas e discussões inflamadas, a direção ágil de Fincher e a trilha sonora composta por Trent Reznor fazem do longa metragem um retrato desta geração 2.0.
segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

desenhar no espaço

DESENHAR NO ESPAÇO
Pinacoteca do Estado de São Paulo
Até 30 de janeiro


Parte de uma importante coleção latino-americana aporta no Brasil e é exposta na Pinacoteca do Estado de São Paulo, após passagem pela Fundação Iberê Camargo, em Porto Alegre. Vindas da coleção Patricia Phelps de Cisneros, cerca de 90 obras fazem parte da mostra Desenhar no Espaço, cujo recorte foi feito pelo venezuelano Ariel Jiménez, curador da coleção. Reunindo importantes artistas do Brasil e da Venezuela, a mostra tem como objetivo firmar um diálogo entre as produções e os países, além de fazer um panorama da formação de movimentos de entre as décadas de 1940 e 1990.

Percebe-se na coleção um apreço pelo abstracionismo, sobretudo em esculturas de ferro ou aplicações em figuras geométricas em telas e madeiras. Seguem este exemplo, obras do brasileiro Helio Oiticica e do venezuelado Carlos Cruz-Diez. A lista de artistas é completa por Jesus Soto, Gertrud Goldschmidt, Alejandro Otero, Willys de Castro, Lygia Clark, Mira Schendel, e outros. A esta última é atribuída uma das poucas obras que se aproximam ao figurativo, intitulada Natureza Morta (1953).