quarta-feira, 13 de maio de 2009

os brasileiros, de andré toral

Antropólogo e historiador por formação, o desenhista André Toral, encontrou nas histórias em quadrinhos uma maneira de juntar profissão e lazer. Seu último trabalho, Os Brasileiros (Conrad, 88 págs, R$38), reúne sete histórias que narram episódios da trajetória indígena, desde a colonização até hoje. Usando diferentes técnicas, Toral trabalha o colorido ou o preto e branco. Narra o choque entre civilizações, mas, sobretudo, dá ao índio o lugar de protagonista. “Quero tirar os índios da posição de vítima da história”, disse o autor. Conversei com ele por telefone e segue aí parte do nosso papo.


Camila Alam: Muitas das histórias de Os Brasileiros mostram uma civilização guiada pelo canibalismo e vingança. São características de uma época ou uma imagem estereotipada?
André Toral: O canibalismo é um tema que se impõe. É o principal traço do comportamento dos habitantes do Novo Mundo, notado por cronistas e viajantes. É também uma forma de vingança. As tribos tinham um complexo ritual de vingança e tentei girar em torno disso. Quis abordar também outro ângulo da conquista. Não podemos só vê-la como uma guerra de brancos contra índios, mas também, e muitas vezes, de índios contra índios. Quero tirar-los da posição de vítima da história e dar a eles caráter de protagonistas.

CA: Você cita na conclusão do livro que a sua formação como antropólogo não influencia nas suas histórias. Tem certeza?
AT: Na verdade, não quis fazer estas histórias como se fosse tese. Tenho medo de que elas virem muito “papo cabeça”. Quero que as pessoas leiam com interesse de leitor de quadrinhos, muito mais do que intelectual. É pra ser divertido. Sou antropólogo sim, mas estas histórias são frutos da minha imaginação, ela é o fio condutor. Todas têm muito de criação literária. Na podemos nos esconder por trás de uma falsa objetividade. A minha história tem autonomia dentro da História. Pretendo ser claro como a noite.

CA: Porque seu traço varia tanto de uma narrativa para outra?
AT: A mais antiga, fiz em 1991, e a mais recente, em 2008. Acho que aprendi a desenhar. Aos 50 anos, faço tudo melhor do que eu fazia antes. Menos enxergar de perto. Deixei de ter timidez. Eu achava que todo desenhista precisava usar nanquim. Mas depois reparei que eu podia scanear o lápis. Essa mudança técnica, aparentemente boba, me permitiu manter no desenho a “mão mole” que o lápis dá. Errou, apagou, não tem drama. A parte que eu mais gosto é a coloração com aquarela. Penso menos e parece que a mão caminha automaticamente.

CA: E porque trabalhar com enredos curtos e autobiográficos? [Em A Alma que caiu do corpo, o autor conta em apenas uma página uma de suas experiências com lendas indígenas].
AT: Eu me coloco lá. Alguém já falou que o difícil é fazer cenas do cotidiano. Não costumo fazer isso, mas achei divertido. Se existe um caminho que gostaria de traçar a partir de agora, é este. Aproximar as histórias do meu dia-a-dia.

CA: Você é daqueles que anota tudo que acontece a sua volta, para uma eventual história?
AT: Eu sou o homem dos papeizinhos. Guardo tudo, mas eles nunca são muito bons. Valorizo a primeira idéia, mas ela não é nada sem trabalho posterior.

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