quarta-feira, 6 de agosto de 2008

josé mojica reencarnado

hey there! Andei meio sumida desse blogspot, né?
E pra tirar o atraso, colo aí embaixo a matéria sobre o tão falado retorno ao cinema do Zé do Caixão, publicada na CartaCapital nº 507 (está nas bancas até sexta feira). A matéria foi feita a quatro mãos, por mim e por Ana Paula Sousa, minha chefa e editora de cultura da Carta.

JOSÉ MOJICA REENCARNADO

CULT. Um grupo bem-posto na indústria dá nova roupagem e status ao cineasta

POR ANA PAULA SOUSA
E CAMILA ALAM


Quando se tornou o Zé do Caixão, há mais de 40 anos, José Mojica Marins era trash por vocação e natureza. Seus filmes eram precários e marginais. Mojica não mudou. Mudaram os tempos e a indústria cultural. E Zé do Caixão chegou onde seu criador não deve ter ousado sonhar.

Encarnação do Demônio, o filme que encerra a trilogia iniciada em 1964, com Á Meia Noite Levarei sua Alma, terá uma sessão especial no prestigiado Festival de Veneza, a partir do final do mês. No Brasil, estreará na sexta-feira 8 em cerca de 50 salas, com distribuição da Fox Film. A reboque do longa-metragem, chega às livrarias uma história em quadrinhos inspirada no personagem.

“Sobrevivi nos últimos anos fazendo clipes para roqueiros e as Noites de Terror, do Playcenter”, disse Mojica, naquela que talvez tenha sido a primeira entrevista coletiva de sua vida, no Cinesesc, em São Paulo, na segunda-feira 28. Os 90 lugares do auditório do cinema não foram suficientes. Alguns jornalistas ficaram de pé.

Mojica só não estava mais espantado porque, no 1º Festival de Cinema de Paulínia, no interior de São Paulo, passara por situação semelhante. Encarnação do Demônio recebeu sete prêmios, incluindo melhor filme de ficção para o júri e crítica. “Fiquei impressionado comigo. Ganhei o prêmio da crítica. Será que foi consolação?”, pergunta. À dúvida, segue-se uma constatação. “Acho que, hoje, meu personagem é quase como uma lenda, tipo Saci Pererê, ou Mula sem Cabeça. Quando eu morrer, vão até dizer que eu tinha poderes”, vaticina.

A “institucionalização” de Mojica e sua transformação em símbolo “cult” não se deve a poderes ocultos. Ao contrário. Criador e criatura entraram de novo na moda graças à mobilização de um grupo bem colocado na área cultural brasileira. Para entender esse plano, iniciado há 10 anos, o primeiro nome a ser lembrado é o de Paulo Sacramento, produtor e montador de Encarnação, e elo entre todos os envolvidos no ressurgimento do Zé do Caixão.

Fã do cineasta desde os tempos da faculdade, Sacramento, montador premiado e diretor do marcante documentário Prisioneiro da Grade Ferro, foi o primeiro a acreditar na realização do filme, com roteiro pronto desde 1967. Ao lado do cineasta Dennison Ramalho, nome importante no terror brasileiro e roteirista de Encarnação, fez o primeiro contato com cuidado. “Queríamos fazer o filme porque era um projeto mítico. O Mojica sempre disse que sua obra não estaria completa sem o fim da trilogia. Mas não queríamos assustá-lo com a proposta”, diz.

Mojica nem de longe se assustou. Ao redor do filme, outras peças foram dando forma ao projeto. A biografia Maldito, de André Barcinski e André Finotti (lançada em 1998), a caixa de DVD’s organizada por Paulo Duarte (em 2002) e a mostra retrospectiva sob curadoria de Eugênio Puppo (em 2007), são algumas delas.

Para Sacramento, os pequenos projetos isolados resultaram em uma contínua exposição do personagem. “Somos todos amigos, atuamos de maneira muito próxima e, por isso, resolvemos nos juntar. A idéia é fazer com que este seja o ano do Mojica.”

Ao filme se junta uma história em quadrinhos. Prontuário 666 – Os anos de cárcere de Zé do Caixão, da Editora Conrad, que chega às livrarias com o longa-metragem, é inspirado no personagem, mas com roupagem e roteiros originais, feitos a quatro mãos por Samuel Casal e Adriana Brunstein.

Alexandre Boide, coordenador editorial da Conrad, confirma que a idéia é reforçar o personagem no mercado. “Fizemos o livro para acompanhar o filme, mais ou menos como no Matrix, onde videogames e animações complementavam a idéia do longa”, diz. Também no livro está o dedo de Sacramento. Foi ele quem levou a idéia à Conrad. “O livro é um subproduto de Encarnação. O público alvo do filme, basicamente formado por jovens, é o mesmo que consome quadrinhos”, avalia o produtor.

Sacramento sempre esteve convicto de que, para modernizar Mojica, seria preciso investir numa produção sem a precariedade anterior, motivo, inclusive, de piada. Entram então em cena os irmãos Caio e Fabiano Gullane, os mais destacados produtores brasileiros da nova geração. Eles estão por trás de filmes como Bicho de Sete Cabeças (2000), Carandiru (2002), O Ano em que meus Pais Saíram de Férias (2007) e, além de Mojica, emplacaram outros dois filmes nesta edição do Festival de Veneza.

“Desde o início, queríamos respeitar o que é o Zé do Caixão, mas trazer para um padrão de qualidade atual. Como atualizar o filme? Investindo em pessoas de alto nível”, diz Fabiano.
O orçamento de 1,8 milhão, se é uma fortuna para Mojica, é pouco para os padrões atuais. Ainda assim, nomes importantes aderiram ao projeto. Entre eles, o estilista Alexandre Hercovitch, que assina o figurino, o músico André Abujamra, autor da trilha, e o diretor de fotografia José Roberto Eliezer (de A Dona da História, O Cheiro do Ralo e outros). Todos eram fãs ou tinham alguma relação anterior com Mojica. Hercovitch fez uma coleção, em 2004, inspirada em Zé do Caixão. Eliezer participara de um documentário sobre ele.

“Estudei muito os filmes e tentei transpor aquele universo, em preto-e-branco, para os dias de hoje”, diz o fotógrafo. “O Mojica era muito aberto ao diálogo. Mas a coisa dos bichos, de aranha, barata, era com ele. Close de olho também.” A fotografia, mistura de cor e P&B, e a montagem são os pontos altos do filme que, no mais, é totalmente de gênero, com cenas desagradáveis a olhos que não gostam de terror e um roteiro cheio de mortos.

“Tomamos todos os cuidados para não ser um filme para rir, e sim para dar medo”, pontua Fabiano Gullane. “Você não tem o Mojica falando errado, por exemplo. Teve um trabalho de acompanhamento no set, fala por fala.” O cuidado com a fala de plurais não conjugados é exemplar dessa “repaginação”.

Em público, ele também só aparece após instruções. Há sempre alguém a acompanhá-lo nas entrevistas e, em qualquer exibição do filme, aparecerá vestido de Zé do Caixão, jamais de Mojica. “Tentamos criar um novo interesse, uma nova imagem. Uma coisa é a carreira dele nos anos 70. Outra, é lançá-lo num mercado competitivo como o de hoje.”

A entrada da Fox Film como distribuidora foi, nesse sentido, fundamental. “Pensamos num público variado, desde os fãs e pessoas que lembram do Zé do Caixão até os jovens freqüentadores de multiplex, para os quais vamos apresentá-lo como um filme de terror ‘de verdade’”, diz Patricia Kamitsuji, diretora-geral da Fox. Esse público seria, em tese, aquele que vai aos cinemas ver Jogos Mortais e O Massacre da Serra Elétrica.

Para Mojica, o que resta é colher os louros. Censurado durante a ditadura, considerado por muitos anos um símbolo do cinema trash, vivendo de maneira simples e sem luxo, ele teve, aos 72 anos, dinheiro e liberdade para fazer o que bem entendesse. O diretor de fotografia conta que as coisas que mais o espantavam no set eram a leveza da câmera, o horário certo para o fim das filmagens, a comida servida e, sobretudo, o vídeo-assist, equipamento que grava o que a câmera filmou e permite a checagem da cena.

“Todos queriam ver como eu me sairia, depois de tanto tempo sem dirigir. Com aquilo renasceu minha vitalidade”, define Mojica, no seu jeito simplório que, com tanta bajulação, tem se revestido com novas ambições. “Pensei em montar uma seita, um clube ou uma ordem. Seria ‘Os Paranormais em busca do desconhecido’. Quero fazer uma passeata também, para protestar contra esse direito de expressão que dizem que temos, mas na verdade ninguém tem.” Com uma boa embalagem, por que não?

1 comentários:

Anônimo disse...

ACHO QUE VC DEVIA COLOCAR AQUELA SUA FOTO COM O MOJICA...